Como acabar com a cultura do estupro (Parte 2)
- Raquel Oliveira
- 6 de out. de 2020
- 4 min de leitura
Atualizado: 17 de out. de 2020

Como eu disse no texto anterior , tem muitas coisas que envolvem a cultura do estupro e que são inconscientes a nós. E hoje a gente vai falar de duas delas: os arquétipos femininos e a relação de poder ligada a eles.

Arquétipos Femininos
Antes do feminismo surgir, havia dois tipos de mulher: a puta e a santa. A santa é a mulher para se casar. A mulher comportada e recatada e que é submissa ao marido. É a mulher que cuida da casa e dos filhos e que é sustentada pelo marido.
Já a puta é a prostituta: é a mulher que os homens vão para terem prazer, para perder a virgindade, para mostrarem que são machos. É a mulher que os homens simplesmente usam para o sexo e depois descartam.
Com o feminismo, esses arquétipos são questionados e há uma tentativa de se quebrar eles, mas o feminismo ainda é muito recente e esses arquétipos estão ligados ao nosso inconsciente e não ao nosso consciente, tornando isso ainda mais difícil quebrar com eles.
Esses dois arquétipos ainda cercam a mulher moderna, dando apenas duas escolhas para elas: ou ela é santa ou é safada, ou ela é comportada ou ela é vulgar, ou ela é submissa a um ou é submissa a vários. E assim por diante.
E a gente precisa quebrar com esses dois arquétipos porque o poder do homem está muito ligado a eles.
Poder
Em ambos as arquétipos o homem tem poder sobre a mulher. No arquétipo da santa, o homem é quem sustenta ela, é o homem que escolhe se vai se casar com ela ou não, é o homem o único que pode transar e fazer sexo com ela. O homem é quem manda nela, é quem diz como ela vai se vestir ou não se vestir. É o homem que controla o dinheiro dela, é o homem que permite se ela vai sair com as amigas ou não. E é inclusive o homem que decide quem vão ser os amigos dela ou não.
Já o arquétipo da puta parece que vai para o lado oposto, mas na verdade ele apenas causa um novo problema, porque a puta é vulgar, ela é a marginal e a que não merece respeito. Ela é a que todos os homens podem usar e depois descartar. Ela é a que, se ela mostra o próprio corpo, ela é vulgar e impura e não merece mais o respeito. Ela é a que não merece amor, não merece carinho, simplesmente por ela “não se dar o respeito”.
E tudo isso está ligado ao poder do homem: porque é o homem quem decide se ela merece ou não o respeito dele, é ele quem decide se ele vai ou não pagar pelo sexo com ela (de maneira direta ou indireta, por exemplo, pagando pelo jantar) e tudo mais.
Onde isso entra a cultura do estupro?
E a cultura do estupro está ligada fortemente a esses arquétipos e ao poder que há neles porque tem uma relação bem injusta com relação ao sexo e esses arquétipos.
Porque a santa tem que ser submissa e não pode gostar de sexo. Ela só faz sexo para procriar e jamais ela pode gostar de sexo e querer ter prazer.
E a puta é apenas a fonte de prazer do homem, mas pouco importa para ele se ela vai ter prazer ali ou não.
Em ambos os arquétipos, o prazer da mulher não importa, não é relevante. Em ambos, o único prazer que tem foco, que precisa acontecer, que precisa ser cuidado e cultivado é o do homem.
E se o homem acha que no sexo a única coisa que importa é o prazer dele, ele pouco vai se preocupar se a mulher ali que eles está transando está sentindo prazer, se está achando gostoso para ela.
A gente percebe isso quando nota que a maioria das mulheres raramente tem um orgasmo. Se não há preocupação que o prazer feminino aconteça, aí é obvio que ele não vai acontecer.
E o oposto da dor é o prazer. Então se o homem e até mesmo a sociedade não se importa com o prazer da mulher, eles também não vão se importar com a dor.
Nos próximos textos eu vou falar mais afundo sobre a relação desses arquétipos com a cultura do estupro.
Mas antes de finalizar, eu gostaria de propor uma solução a esses arquétipos.
Solução
Eu acho que muita gente vai achar que a solução seria dar o poder a mulher. Mas acho que essa não é a solução, porque ai entra o arquétipo da mulher empoderada e que eu vou falar mais sobre em um post no instagram. Se você não segue o instagram do Fio Vermelho, clica aqui para ficar por dentro das dicas e também do que eu vou falar sobre a mulher empoderada.
Eu acho que para resolver isso a gente não precisa criar um novo arquétipo. A gente na verdade precisa quebrar com esses arquétipos.
E eu acho que a melhor forma de fazer isso é você se perguntando: quem eu quero ser? Que valores eu quero cultivar? E isso vale tanto para os homens quanto para as mulheres. E aí, quando você descobre e lista de fato quem você quer ser, quando você tem na sua mente uma ideia clara de quem você quer ser e luta para ser essa pessoa, você começa a agir de forma ativa sobre as suas ações e não de forma passiva.
Porque se a gente apenas age por impulso, se a gente não questiona as nossas ações e escolhas, se a gente apenas age por agir, é muito mais fácil a gente ser influenciado por esses arquétipos e apenas contribuir para essa cultura do estupro.
Mas se você trás para a consciência quem você quer ser e alinha isso as suas ações e escolhas, você não vai ser influenciado. Ou pelo menos, vai reduzir a influência que você sofre.
Espero que esse texto tenha te feito pensar sobre como você enxerga as mulher ou se enxerga (caso você seja uma mulher)!
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